Por: Heráclito Barbosa*
Existem pessoas que passam por nossas vidas e, de
alguma forma, contribuem para ampliar o nosso desenvolvimento espiritual e
político-social. Wanderlino Nogueira Neto é uma delas.
No ano passado fui eleito para cada uma das vagas,
nas etapas municipal, territorial, estadual e nacional, de delegado nas
Conferências dos Direitos da Criança e do Adolescente. Na última, entre 12 a 14
de agosto de 2012, em Brasília, no Centro de Convenções Ulysses Guimarães,
conheci pessoas que são, hoje, muito significantes em minha vida e dentre elas
um senhor baixinho, de cor brasileira, com olhos de eterna criança, repleto de
esperança, de uma inteligência inexplicável e que chamou atenção de todos os
presentes na etapa final da 9ª Conferência Nacional dos Direitos da Criança e
do Adolescente. Seu nome: Wanderlino Nogueira Neto, o meu amigo da ONU.
Nas religiões brasileiras, de matriz
africana, todos os indivíduos são respeitados, não importando que seja uma
criança ou um idoso. Todos merecem e devem ser respeitados. Nogueira é um idoso
com espírito de criança, que cuida de outras crianças e, assim, como na
liturgia do respeito da cosmovisão afro-religiosa, ele está muito bem adequado.
Por isso ele é uma pessoa muito respeitada no Brasil, amado pelas crianças,
adultos e idosos.
Dentre os poucos que tiveram a honra de ter um
contato direto com este convidado especial da 9ª Conferência, eu fui um deles.
Durante os três dias do evento fiquei vestido com os meus trajes que costumo
usar no terreiro, em grandes festividades. No dia que o conheci estava usando
várias contas: uma de cor azul forte, do orixá Ogum, ancestral do ferro, que
abre caminhos para que eu possa passar em paz, uma do ancestral Katendê,
responsável pelo encantamento das folhas usadas em banhos de força (maionga) e,
outra, do meu pai Oxalá, com confirmações mescladas de verde e branco. Todos
olhavam meus "colares", contas sagradas, e ficavam deslumbrados com
tamanha beleza. Usava também um gorro com detalhes da cultura africana, de cor
amarela, com pinturas nas cores verde e marrom que ganhei do Táta kinsaba (responsável pelo plantio e
colheita de folhas no candomblé) Gilberto
Almeida de Magalhães, que é autor da monografia intitulada “Terreiro Caxuté, Um Caminho na Minha Vida”, apresentada
para obtenção do diploma de pedagogo, pela UNEB Campus XV. Este filho do Orixá Obaluayê.
Para completar fazia uso de um broche
com o símbolo de Brasília. Ele era usado por todos os delegados para terem
acesso garantido ao Centro de Convenções Ulysses Guimarães, broche esse que
Wanderlino também estava usando.
Devo aqui agradecer pelo amor e carinho que a
presidenta do Conselho Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente, Miriam Maria José
dos Santos, e a conselheira Maristela
Serafin Cizeski, representante da Pastoral da Criança, que mora em Gaspar,
cidade brasileira do Estado de Santa
Catarina na Região Sul do Brasil, tiveram comigo
durante todo o evento, dando-me ainda acesso ao palco principal, no qual subiu
a presidenta Dilma Rousseff, a cantora Ivete Sangalo, o ator Marcos Frota,
dentre outras autoridades e artistas nacionais e internacionais. E foi neste
palco que conheci o baluarte Wanderlino e pude conversar bastante com ele a
respeito das Políticas Públicas para as Crianças e os Adolescentes. E até
tiramos fotos juntos. Foi muito humilde e grandiosa a nossa conversa.
Foi lá que ele me saudou com a expressão "Axé
abá". Sabia o que era "axé", mas desconhecia aquela outra
palavra usada, "abá". Não tive vergonha e logo perguntei o seu
significado. Com sua voz solene e graciosa respondeu-me que era
"amor". Saudava-me com uma expressão, no idioma Yorubà que pouco
conheço, desejando-me "muita força e amor".
Perguntou-me depois quais eram os meus Orixás, e
respondi na época : “sou filho de Xangô, Oxum, Ossain e Oxalá, destacando minha
yá (mãe) Oxum, minha mãe criadora”, e é essa Orixá, que é a dona do orí
(cabeça) da minha amada avó, Alzira Félix dos Santos, já iniciada no aṣè
(12/01/2013), juntamente comigo pela Sacerdotisa Afro Elvira da Silva Sena, do
Ilê Axé Junsun Adê. A qual jogou os búzios juntamente com minha mãe biológica, Mãe Bárbara do Terreiro
Caxuté, Coordenadora Territorial da Federação do Culto Afro Brasileiro no Baixo
Sul da Bahia, as quais consultaram Ifá, o senhor dos búzios, para os meus
orixás. Sou filho de todos, pois cada um tem lugar reservado no meu coração, no
candomblé não existe a separação.
Logo ele me disse ser filho do “Velho das Palhas”,
cuja saudação quando ele chega em solo, seus filhos o saúdam e reverenciam-no
dizendo : “Atotô babà!”. Esse “Velho das Palhas” é chamado de Omolu no
Candomblé da Bahia.
Quando Wanderlino referiu-se ao Orixá Omolu como
“Velho das Palhas” é que, segundo contam, em um mito afro-religioso transmitido
pela oralidade e que está recontado no livro Mitologia dos Orixás, do antropólogo da USP, o professor Reginaldo
Prandi, é que no Orum, mundo invisível dos orixás, estava havendo uma festa
(xirê) para todos os orixás, e quase todos compareceram, mas Obaluayê não, este
ainda não tinha chegado ao local, estava do lado de fora coberto de palhas para
velar suas chagas. Ogum preocupado com seu amigo Obaluayê o chamou para entrar.
Ao chegar ao Abassá (casa ritualística e litúrgica do povo banto), a yabá Yansã
em forma de ventania saudou o senhor que estava coberto de palhas, nesse
momento todos pararam para ver a ventania que levantava as palhas e viram as
chagas de Obaluayê estourarem, transformadas em flores de pipoca, no ar. Todos
naquele momento ficaram surpresos e vislumbrados com a beleza que estava
debaixo das palhas. A partir desse momento ele foi reverenciado por todos como
Omolu, o mais belo príncipe que já tinham visto no universo.
No candomblé, Omolu é coberto de palhas, ele é o
responsável pelas doenças, ele pode dar e retirar enfermidades conforme o
merecimento dos seus filhos. Ao chegar à terra todos o saúdam dizendo: Atotô
ajuberô! Atotô Omolu, Atotô Obaluayê! E
nesse momento, todos em preces e cantigas, jogam pipocas de milho (flores) para
cima, pedindo proteção, muita saúde, pedindo ao senhor das palhas e das flores
que não deixe nenhuma enfermidade nos tocar.
Pois é... O meu amigo Wanderlino é como um filho obediente, que procura
sempre se livrar das doenças do mundo, combatendo as mais graves enfermidades:
a prostituição de menores, a intolerância religiosa, envolvimento de crianças
em conflitos armados, venda de crianças, a pornografia infantil, os
preconceitos, a má educação, o tráfico de menores, a exploração do trabalho
infantil, a lesbofobia, a homofobia, a humanofobia, a intolerância religiosa e
muitas outras doenças perigosas que estão sendo reproduzidas em quase todas as
sociedades. Wanderlino é uma criança que adora cuidar dos seus irmãos e isso é
o papel do bom cidadão, do bom filho, papel da pessoa humana.
Ao saber que recentemente o nosso Brasil, na pessoa
do amigo Wanderlino, hoje Defensor de Direitos da Organização das Nações Unidas
(ONU), foi o mais votado para ocupar uma das 18 cadeiras do Comitê de Direitos
da Criança e que foi o mais votado de todos com 161 votos dentre os 189 países
votantes, fiquei muito contente e alegre, pois a presidenta Dilma Rousseff e a
sociedade civil os indicaram a eleição sabendo dos esforços e compromissos que
ele já tinha e que agora eleito terá ainda mais com nossa nação e demais
países. Acredito num país melhor, acredito na erradicação da violência sexual
contra crianças e adolescentes. Acredito plenamente que o meu amigo, Wanderlino
Nogueira Neto, foi o mais indicado do Brasil para o Comitê dos Direitos da
Criança da ONU e que o Brasil e o mundo não irão se arrepender. Atotô babà!!!
*Heráclito Barbosa, ex-vereador jovem de Valença;
Poeta afro brasileiro; Administra o blog SERAFRO, e é membro do Terreiro
Caxuté.
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